terça-feira, 11 de janeiro de 2011

Um pouco de Shakespeare

Zé Celso

Treco - Entrevista com Zé CelsoPrograma do Festival de Bobigny, França

Por que você decidiu montar O Rei da Vela?
Porque estávamos, depois do golpe de 64, perdidos, sabendo que o que tinha sido pensado antes não era mais o mesmo. O país tinha entrado em outra e era preciso descobrir o que estava acontecendo. Pedimos a dramaturgos, cineastas, estilistas, artistas plásticos, para nos enviarem peças, curta-metragens, vestidos, trajes que sintomatizassem essa grande mudança que havia no ar, aliás, em todo mundo não somente no Brasil, e iríamos fazer um espetáculo com essas contribuições todas. Mas nada que vinha nos revelava nada. Até que uma leitura em voz alta do Rei da Vela feita por Renato Borghi num apartamento da Vieira Souto em Ipanema para um grupo resumido de amigos, revelou a potência inclusive retórica do texto que procurávamos. Estava ali. Havia sido escrito de 1933 a 1937, nunca tinha sido montado e iluminava todo momento que estávamos passando. Eu fui para a casa do filho de Oswald, Nonê, com sua primeira mulher, uma francesa, e me atirei no Baú onde estava toda a obra do pai. Li tudo. Virei. Em um mês e meio montamos a peça, ela já estava em nós. E foi a maior revolução cultural que o teatro fez na história do Brasil pelo menos. Pois não ficou só no Teatro, se alastrou como peste no movimento tropicalista que hoje se alastra no movimento mix, no mundo inteiro. Caetano Veloso e Gilberto Gil, são seus divulgadores no mundo, mas cada vez mais aparecem estudiosos que querem saber de donde vem essa grandeza que é deles mas também da libido cultural que a cultura brasileira tem a dar ao mundo e que tem em Oswald sua maior antena.

Bertolt Brecht – Uma Breve Biografia (1898-1956)

 

 
Edmundo Moniz
 
Brecht é uma época. Uma época tumultuosa de rebeldia e de protesto. Refletem-se, em suas obras, os problemas fundamentais do mundo atual: a luta pela emancipação social da humanidade. Brecht tem plena consciência do que pretende fazer. Usa o materialismo dialético da maneira mais sábia para a revolução estética que se dispôs a promover na poesia e no teatro.
 
O teatro épico e didático caracteriza-se, em Brecht, pelo cunho narrativo e descritivo cujo tema é apresentar os acontecimentos sociais em seu processo dialético: Diverte e faz pensar. Não se limita a explicar o mundo, pois se dispõe a modificá-lo. É um teatro que atua, ao mesmo tempo, como ciência e como arte.
 
A alienação do homem, para Brecht, não se manifesta como produto da intuição artística. Brecht ocupa-se dela de maneira consciente e proposital. Mas não basta compreendê-la e focalizá-la. O essencial não é a alienação em si, mas o esforço histórico para a desalienação do homem.
 
O papel do autor dramático não se reduz a reproduzir, em sua obra, a sociedade de seu tempo. O principal objetivo, quer pelo conteúdo, quer pela forma, e exercer uma função transformadora, que atue revolucionariamente sobre o 'ambiente social.
 
GALILEU
 
Brecht, que passou pelo expressionismo, não ancorou o seu barco em nenhum dos portos das escolas literárias. Apesar de ligado ao Partido Comunista, não se subordinou ao realismo socialista. Ao contrário, opôs-se a ele com ardente tenacidade. Daí a repulsa das autoridades soviéticas pelas suas peças teatrais que foram proibidas de serem representadas na Rússia de Stalin.
 
Muito embora Brecht não se tivesse pronunciado abertamente contra os processos de Moscou, em virtude da pressão que sofreu, no ocidente, sob o pretexto de que o combate a Stalin significava o fortalecimento de Hitler e do nazismo, foi com profundo horror que ele acompanhou os trágicos acontecimentos que levaram os principais dirigentes da revolução russa, companheiros de Lênin, a confessar, antes serem fuzilados, uma série de crimes hediondos que jamais cometeram.
 
Foram estas falsas confissões, segundo Isaac Deutscher, que levaram Brecht a escrever Galileu Galilei, talvez a mais importante de suas obras dramáticas. Há muito de Kamenev, de Zinoviev e de Bukharin no genial astrônomo que, vítima da Inquisição, atirado no cárcere, diante dos instrumentos de tortura, se viu na contingência de renegar as próprias idéias.
 
A incompatibilidade de Brecht com o regime stalinista era tão aguda que, ao exilar-se da Alemanha de Hitler, preferiu asilar-se nos Estados Unidos, onde se sentiu mais seguro.